Ebook - Inclusão e Gênero: Construindo equidade e respeito na diversidadeAtena Editora

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1. Inclusão social. 2. Identidade de gênero. I. Cavalcanti, Vanessa Ribeiro Simo...

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capa do ebook Inclusão e Gênero: Construindo equidade e respeito na diversidade

Inclusão e Gênero: Construindo equidade e respeito na diversidade

Publicado em 23 de março de 2025.

Escritas sobre si mesmas: 
Enredadas feministas e possíveis manifestos para e sobre proteção e vidas

"Cheguei à teoria porque estava sofrendo,  a dor dentro de mim era tão intensa que  eu não poderia continuar a viver.

Cheguei à teoria desesperada, querendo compreender, querendo entender o que estava acontecendo ao meu redor.

Acima de tudo, cheguei à teoria porque queria fazer a dor ir embora.

Eu vi, na teoria, um local para a cura.”

(bell hooks. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade, 2013, p.59).

Uma obra coletiva que traz o compromisso com estudos feministas e epistemologias interdisciplinares, compromisso de fazer pensar e de interpretar o Tempo Presente. Com o título Inclusão e Gênero: Construindo equidade e respeito na diversidade, o objetivo geral é contemplar os três Is (incluir, inserir e integrar) a partir de investigações, ensaios e experiências que transitem entre teorias e metodologias que relatem, descrevam, recomendem ações e agendas em prol da diversidade e da equidade.

A primeira impressão e contributo está justo na composição da capa, realizada pela artivista feminista Vanessa Rocha¹ - https://rochavanessa.46graus.com/inicio/. Fotógrafa documental e pesquisadora vinculada ao Grupo de Pesquisa Gênero, Alteridades e Desigualdades (GAD/NEIM) e ao PPGNEIM-UFBA, atualmente investiga dinâmicas de socialização, simbolismos e mecanismos de resistência entre mulheres trans e travestis inseridas em contextos de prostituição no Centro Histórico de Salvador. Compõs o mosaico em preto e branco, porcurando espelhar sutilezas, luzes e sombras, contrastes da vida cotidiana.

Estética e Ciências, artes e academias podem ultrapassar barreiras e matizar mundos possíveis. Interagir entre gerações, experiências, territórios e, especialmente, valorizando interfaces de narrativas é eixo comum e conectivo nos estudos de gênero e feminismos. A investigação nesse campo tem sido promissora, revela potencialidade transdisciplinar e com base em metodologias ativas, artivistas e críticas.

Nesse trânsito de ideias, narrativas e fazeres, a descoberta de outra paixão: a fotografia e o audiovisual. Trocando impressões, experiências e técnicas submergem registros digitais e analógicos; apresenta detalhes e fragmentos presentes em espaços do cotidiano urbano. Através do seu caminhar pela cidade e, consequentemente, da sua observação e registros que dela faz, destaca particularidades que muitas vezes não são percebidas, em meio ao grande fluxo de informações e mediações que ocorrem na vida urbana contemporânea. Todo esse processo pela busca de um objeto, nítido, lá fora, sobre o qual se fala. Ficam obscurecidos o laboratório, a rua, a praia, a câmara-escura da revelação. Para a contemplação, apenas a foto nítida e clara, o objeto construído pelo incomensurável da retina. (Vanessa Rocha, março de 2025).

Olhares atentos, investigativos, reflexivos e provocativos. Isso faz sentido e ganha a dimensão de escrita acadêmica, sem deixar de lado a posicionalidade, a intrínseca relação entre identidades e memórias narradas, recontadas e ouvidas. O eixo temático escolhido para essa coletânea – Inclusão e Gênero – traz contribuições, perspectivas e análises que conectam categorias e instrumentos metodológicos distintos, reunindo investigadoras/es que se comprometem com estudos teóricos, ensaísticos e empíricos atuais e resultados de estudos realizados na modalidade mais avançada do ensino superior (Stricto Sensu).

Como organização geral, temos quatro sub-divisões em eixos temáticos, quais sejam: 1) Teorias e sistemas, com capítulos escritos por Christina Jessica Carney, Arthur Fachini e Gabriela Maria Pinho Lins Vergolino; 2) abordagens dentro dos estudos queer, kuir e feministas e aproximações com contextos educativos, com autorias de Flávia Nogueira Gomes, Nara Rita de Oliveira Silva e Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti e Be Silva Brustolim, 3) Linguagens e cultura, apresentando investigações que envolvem literatura e imagens, sob a escrita de Isabela Vince Esgalha Fernandes, Sandra Alves Moura de Jesus e a dupla Jéssica Soares da Silva Santos e Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti; 4) Poder e Políticas Públicas, com contribuições de Paloma Leite Diniz Farias, Juliana Borges Kopp, Andressa de Sousa Santos Ferreira e Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti, Fabiana Neiva Almeida Lino e, por fim, Jane de Jesus Soares e Elainne Thaís Oliveira Ladeia.

O elenco de investigações, análises e ensaios trazidos nessa coletânea também apontam para outras linguagens, ainda pouco exploradas no campo acadêmico. Deste modo, reforço a urgência em interligar saberes e expressões. Esse tem sido o foco de uma disciplina intitulada “Estudos Feministas” (2022 a 2025) e que resulta também em várias produções. Exemplo disso foi a anterior obra Poéticas Feministas; por uma educação antirracista e revolucionária, onde três investigadoras integradas ao PPGNEIM-UFBA abrem caminhos através de escrita afetuosa sobre a necessidade de “não estarmos sós”. Samantha Carvalho, Andrielle Antonia e Maria Beatriz Dias (2022) escrevem sobre “o movimento é em círculo? ”, “um(na)danças” e “dessilenciar”.

Do ponto de vista acadêmico, estão inseridas na pós-graduação e representam diversas identidades de gênero, de raça-etnia, de formação, de classe. Todas, incluindo leitoras/es, se unem em prol do cessar as violências, não permitir e coibir quaisquer situações em ambiente universitário que não permitam, proíbam ou apaguem mulheres em sua formação, na construção individual e coletiva de espaços de segurança, de bem viver e de circular conhecimentos e saberes.

As palavras poéticas servem de criticidade e de inspiração para mencionar temas tão profundos, cruéis e recorrentes. As violências sobrepostas (Cavalcanti, 2018) continuam a persistir diariamente na vida de meninas e mulheres, cis, trans, negras, indígenas, quilombolas, brancas, migrantes, urbanas, rurais, com diferentes faixas etárias, com contextos familiares e sociais múltiplos. As palavras alertam e não deixam a teimosia ir embora: hemos de viver melhor, em um mundo mais justo, igual e respeitoso.

O que descrevemos e analisamos continua a acontecer, todos os dias, nos quatro cantos desse país continental. Queremos não ter de contar mais casos, mais mortes e mais cenas violentas ou esperar por justiça social, acolhimento multidisciplinar e resolutivo de longa duração. Manifestar desejos de pessoas comuns que no ir e vir nas ruas, nas escolas e universidades, nos pontos de ônibus e dentro de suas residências possam viver sem medo e sem violências tipificadas ou sobrepostas. É preciso mencionar que são ações coletivas que instigam pressão social, alertam urgências em políticas públicas (mesmo as existentes merecem e precisam de inovação, tecnologias e redes articuladas) e, especialmente, a efetivação se conjuga no plural. Juntas e enredadas para fortalecer, fomentar e coibir quaisquer violências, opressões e assédios.

Se no passado as invisibilizações foram marcantes, permanecem no presente e exigem soluções céleres. Há constância e urgência na proteção, com destaque a determinados grupos de meninas e mulheres pelas vulnerabilidades e intensas fragilidades. Das sinalizações às agendas inter-institucionais, alianças e enredamentos, dinâmicas que já foram ensinadas, aprendidas em tempos pretéritos, podem ser sinais de compromisso e ética em prol de direitos humanos interconectados e fundamentais.

Em regimes recentes (ditatoriais e de frágeis democracias), milhares foram clandestinas, dissidentes, criadoras de redes “quase” inviáveis. Algo que move a História das Mulheres no Tempo Presente (últimos cinquenta anos) são justamente tais enlaces. Com o intuito de não permitir opressões, defender existências e convivências (familiares, sociais, institucionais).

Em qualquer tempo, reunir pessoas, instituições e redes de conhecimento e de articulação, demonstra que nada está garantido e ações precisam alcançar o cotidiano, as instituições, além de processos criativos. Os problemas são inúmeros, mas projetos específicos e ações de longa duração tem resultados positivos e podem ser referências basilares para o pensar mais global. São manifestações recorrentes contra violações, por direitos, em distintos territórios, para além de classe, raça/etnia e sexualidades.

As últimas décadas foram de intensas agendas, na mesma medida que avanços nos discursos conservadores e práticas machistas e misóginos. Acrescente-se, ademais, movimento racistas, xenófobas, transfóbicas dentre outros como fatores agravantes.

No contexto brasileiro e latino-americano foram de agendas e marcos legais sobre violência de gênero em suas diversas manifestações (desde a intimidade ao cyberbullying, dos mapas e estatísticas que não nomeiam, de agravos em situações de violência extremada), formas de combater, coibir e enfrentar processos que afetam sobremaneira a vida de meninas e mulheres. Se os primeiros alertas de chamadas micro-violências já são sinais para movimentar social e politicamente, os agravos devem ser ainda mais urgentes quando indicadores são reveladores de acréscimos frequentes nos assassinatos de mulheres cis e trans, negras, jovens e idosas.

Do que se espera no ambiente acadêmico, a triangulação crucial das Universidade (ensino, pesquisa e extensão) pode assinalar caminhos e recomendações a partir de análises apuradas, interpretações a partir do empírico e ações com base na educação e na extensão comunitária. Capítulos desse livro denotam essa preocupação.

Caminhos para igualdade? Para inclusão e equidade? São muitos os exemplos de “nem meio caminho andado” ou de denúncias sobre processos de longa duração e não protetores de vidas.

Assédios morais e abusos sexuais, extrativismo acadêmico, feminicídios, opressões que também estão presentes dentro de instituições devem ser detectadas e ações de proteção e garantias das vítimas acionadas com máxima atenção. Se mortes por armas, em ambientes doméstico-familiares e por pessoas íntimas são anunciadores de problemas sociais graves, imaginem em territórios-espaços como escolas, universidades e outros organismos que deveriam assegurar vida, dignidade e respeito?.

O trabalho é árduo e diário, exige enredamentos cada vez mais pautados em dados e evidências para indicar mudanças infraestruturais, orçamentárias e educativas. São agendas prolongadas e não podem ficar para amanhã. Que ajam mais corpos e expressões contra os múltiplos sistemas de opressões, ditaduras e extermínios. Que outras instituições – não só acadêmicas - e cada vez pela e para educação em Direitos Humanos de meninas e mulheres sejam metas, propósitos e incitem movimentos sociais para liberdade. Não olvidar, nunca, quem foram, somos e seremos. Nunca sozinhas, sempre em rede.

Salvador-Coimbra, março de 2025.

Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti

Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (Universidade Federal da Bahia).

Como práxis feminista e de integrantes da grande área interdisciplinar de estudos sobre mulheres, gêneros e feminismos, a abertura foi com menção à poiesis e às artes de ultrapassar opressões e violências, utilizar linguagens múltiplas como referência e intenção de bem viver. Deste modo, a escritura para acompanhar os textos que se seguem convida a entrar na inspiração de romper com pontos cegos e usar todos os instrumentos didáticos, artísticos e de conexão.

A advogada e escritora Samantha Carvalho, uma das autoras dessa obra, ofereceu às outras e às leitoras e aos leitores que apreciam boa leitura, uma poesia inédita, escrita justo com o motivo de reunir forças e potencialidades.

A força e potência das nossas águas feministas

Samantha de Araújo Carvalho[2]

Nada se escuta de uma água congelada.

Não há movimento.

O corpo não reage.

Não transborda.

A vida não corre. Fica paralisada.

O pensamento endurece.

Não tem espaço para se desenvolver.

Fica sem ir, sem ver.

É um lugar de não-crescer.

Essa água congela a empatia, a humanidade,

Nossa solidariedade diante das injustiças.

São águas frias que não se cruzam,

Não atravessam cachoeiras,

Não se unem nos leitos dos rios.

São águas paradas, sem reação.

Sem caminho. Sem chão.

Neste riacho frio da exclusão das diversidades,

As águas-pensamentos são rígidas, inflexíveis

Não desaguam em lugar algum.

São águas que banham pensamentos

parados

nas discriminações

e nos preconceitos.

É inóspito viver parado aqui.

Da outra margem, fluem as águas feministas

das Cachoeiras e Cataratas

Às vezes, desaguam, às vezes, despencam

Mas seguem em frente

Em uma corrente da Inclusão e da Diversidade

Que corre por toda a nossa Natureza

Nossa Natureza branca, negra, parda, indígena, quilombola, ribeirinha, caiçara

Nordestina, nortista, sudestina, sulista, do centro-oeste brasileiro

Nossa Natureza que comporta outras nacionalidades, outras cores,

Outros idiomas, outras vozes, outros gêneros, outras orientações sexuais.

Que não são Outras nem Outros.

São apenas novas formas de Ser e Se Perceber.

Hierarquizar as diferenças é tirar a nossa imponência

É excluir a nossa potência

É esquecer a nossa essência.

De águas diversas e plurais,

que nos constituem e nos pertencem.

Nas Cachoeiras e nas Cataratas Feministas

Correm águas cristalinas

De renovação, críticas e revisitações feministas

Elas demandam união para desaguarem mais fortes

Não precisam correr em unanimidade e total harmonia

Mas precisam se reencontrar para continuarem juntas

Atravessando e enfrentando rochas

Rochas que pesam sobre o todas e o todes,

Impedindo a circulação crítica feminista de base humana.

Em tempos de catástrofe humana-ambiental,

Estamos perdendo águas cristalinas, genuínas

Por águas sujas da exclusão, do ódio às diferenças

Dependemos da força ampliada das águas do todas, todos e todes

Para desaguar e fluir juntas/os/es.

Porque Unidas/os/es - e não divididas/os/es - somos mais fortes. Sempre.
 

 

[1] Mulher cis, bissexual, bacharela em Direito.Especialista em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidades, bacharelanda em Estudos de Gênero e Diversidade. Mestranda em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismos pela Universidade Federal da Bahia (PPGNEIM/UFBA). Nascida em Santa Terezinha de Goiás, criou-se no interior do extremo norte do estado da Bahia, graduou-se em Pernambuco e, atualmente, reside na capital baiana.

[2] Escritora, Advogada e Pesquisadora. Mestra em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (UFBA). Especialista em Direitos das Mulheres (UNIDBSCO/PR) e Direito Processual Civil (UCAM/RJ). Foi integrante da Comissão das Mulheres Advogadas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/BA). Autora do Livro “A Teoria Geral do Processo e sua Inaplicabilidade no Processo Penal” (RS). Email: samantha.carvalho@ufba.br.

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Inclusão e Gênero: Construindo equidade e respeito na diversidade

  • DOI: https://doi.org/10.22533/at.ed.296251903

  • ISBN: 978-65-258-3229-6

  • Palavras-chave: 1. Inclusão social. 2. Identidade de gênero. I. Cavalcanti, Vanessa Ribeiro Simon (Organizadora). II. Título.

  • Ano: 2025

  • Número de páginas: 220

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