Práticas da socioeducação no Distrito Federal
Publicado em 22 de dezembro de 2021.
Hannah Arendt, no ensaio “A Crise da Educação”, examina a sociedade moderna e considera a educação como uma atividade das mais importantes e necessárias da sociedade, renovando-se sempre com o nascimento de novos seres humanos. Estabelece uma relação direta entre a autoridade e a responsabilidade, sendo a primeira uma inerência da segunda. Para ela, a educação possui função política. Considerando essa perspectiva, qual é a função da Socioeducação no contexto social brasileiro contemporâneo? Como o Estado brasieliro tem realizado o projeto da Socioeducação para os adolescentes considerados autores de comportamentos desviantes? Um questionamento recorrente, ao discutir-se o Sistema Socioeducativo, é a perpetuação do caráter punitivo em que ele se estrutura, reforçando, com frequência, o histórico de maus tratos aos adolescentes.
Consideramos pertinente o debate levado a cabo pelas reflexões do presente livro. A nosso ver, é urgente a necessidade de refletirmos, na academia e nas instâncias sociais, sobre o que é a Socioeducação. Discutir como ela pode colaborar para capacitar o adolescente para a vida política na esfera pública ou, ao contrário, condicioná-lo a rótulos de incapacidade e de aniquilamento da condição de ser humano. O livro é resultado do curso de Especialização em Políticas Públicas em Socioeducação, pela Escola Nacional de Socioeducação (ENS) e Universidade de Brasília (UnB).
A obra discorre sobre os temas investigados por cinco autores, que propuseram-se analisar o Sistema Socioeducativo do Distrito Federal-DF. Buscou-se apresentar um panorama da Socioeducação no Distrito Federal, propondo examinar os contextos profissionais no qual os autores estavam inseridos, apontando situações e temas que do ponto de vista deles se caracterizavam como experiências, e práticas presentes no Sistema Socioeducativo. O livro é composto por por cinco capítulos nos quais são apresentadas experiências e práticas resultantes de pesquisas de campo.
A discussão do primeiro capítulo é assinada por Janaina Teles, que realizou um estudo de caso no âmbito da medida socioeducativa de Liberdade Assistida. A autora descreve uma prática sobre o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) de um adolescente. Defende que o comprometimento dos profissionais que atuam no Sistema Socioeducativo para manter um olhar diferenciado para identificar as dificuldades e potencialidades do adolescente pode resultar em mudança e ruptura dos comportamentos desviantes. Essa afirmação parte dos indícios positivos do estudo de caso em análise, por meio do qual o adolescente foi encaminhado para o atletismo, tornando-se atleta profissional com oportunidade possibilitada no período em que cumpria medida socioeducativa.
O segundo capítulo, da autoria de Elessandra Cruz, aponta questões sobre a educação formal e não formal, com os resultados do esudo de campo na Unidade de Atendimento de Semiliberdade do Recanto das Emas. Para Cruz, o projeto educacional oferecido ao adolescente que cumpre medida deve ser formal e não formal, considerando-as como atividades complementares e indissociáveis para se pensar em ressocialização. Ela chama atenção para que as atividades de formação não formal devam respeitar o perfil da cada adolescente. Este deve ser visto como adolescente dentro da coletividade e ter respeitadas as suas particularidades.
Dando continuidade, Rosângela Alves apresenta o estudo de campo oriundo da pesquisa realizada na Unidade de Internação de Santa Maria. Ela investiga o processo de escolarização, examinando como as práticas escolares dentro da Unidade são propostas pelos docentes e pelas demais profissionais do Sistema Socioeducativo. O estudo indicou que a escolarização na Unidade está estruturada para seguir a mesma estrutura da escola fora da Unidade, havendo, contudo, implicações internas que não permitem o cumprimento da carga-horária determinada pela Secretaria de Educação do Distrito Federal. Segundo a autora, a questão mais recorrente é a redução de agentes socioeducativos para fazerem a supervisão dos adolescentes no momento das aulas.
O quarto capítulo é da autoria de Elizangela Barbieri. Analisa o Plano Individual de Atendimento – PIA, considerando-o como instrumento relevante do adolescente que cumpre medida socioeducativa. A autora reflete como o PIA pode se constituir em instrumento que colabora com a mudança de comportamento infrator dos adolescentes. No entanto, a pesquisa apontou dificuldades da equipe responsável pela elaboração do PIA: não se atribui importância ao planejamento individual do cumprimento da medida do adolescente.
Outra prática no Sistema Socioeducativo é trazida por Edson da Silva, com a investigação da oficina de música para adolescentes que cumprem medida socioeducativa de internação. O autor aponta indícios de que essa experiência se constitui como exitosa, uma vez que possibilita, por meio da educação, capacitar o adolescente para os contextos sociais em que serão encaminhados após a internação. A investigação demonstrou que o adolescente que participa da oficina de música é apresentado a um mundo novo que muitas vezes parecia inalcançável e alheio ao contexto social dele.
Os estudos que são apresentados nesse livro, apontam realidades para pensarmos a Socioeducaçã, uma vez que é a política pública educacional mais importante para os adolescentes autores de atos infracionais. A nosso ver, torna-se imprescindível o debate acerca do Sistema Socioeducativo. Trata-se de uma instância social gerida pelo Estado brasileiro que ainda é marcada por práticas que se limitam basicamente a uma vertente punitiva, abordagem que, com as reflexões desta obra carece de mudanças.
Darliane Silva do Amaral
Brasília/2018
REFERÊNCIA
ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. Trad. de Mauro W. Barbosa. 7. ed. São Paulo: Perspectiva, 2014.
Práticas da socioeducação no Distrito Federal
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DOI: 10.22533/at.ed.134211712
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ISBN: 978-65-5983-813-4
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Palavras-chave: 1. Liberdade assistida - Distrito Federal. 2. Socioeducação. 3. Adolescente. I. Amaral, Darliane (Organizadora). II. Cruz, Elessandra (Organizadora). III. Título.
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Ano: 2021
Artigos
- SOCIOEDUCAÇÃO E LIBERDADE ASSISTIDA: ESTUDO DE CASO SOBRE O SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO DE VÍNCULOS
- EDUCAÇÃO FORMAL E NÃO FORMAL: ANÁLISE DAS PRÁTICAS EDUCATIVAS NA UNIDADE DE ATENDIMENTO DE SEMILIBERDADE
- ESCOLARIZAÇÃO NA SOCIOEDUCAÇÃO: ANÁLISE DE PRÁTICAS ESCOLARES
- ANÁLISE DA UTILIZAÇÃO DO PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO
- OFICINA DE MÚSICA COMO ATIVIDADE TRANSFORMADORA NA SOCIOEDUCAÇÃO