As intermitências da morte, de José Saramago: um ensaio alegórico da finitude
É provável que todo esse trabalho tenha começando quando um dia, ao ler o “Ensaio sobre a cegueira”, de José Saramago, cocei os olhos para ter certeza que não estava ficando cego. O livro, pela rica descrição, causa o medo de não poder olhar, muito menos reparar. A força de se perceber diante daquele gesto me tornou um completo apaixonado pela escrita saramaguiana. Daquele instante em diante, Saramago era leitura de cabeceira. Só os títulos revezavam. Um, depois outro, e outro, fui devorando toda a sua bibliografia. Seguindo esse vagar, um dia cheguei “As intermitências da morte”. Já na primeira frase: “No dia seguinte ninguém morreu”, constipei-me. De imediato, lembrei da sensação de anos antes, com a cegueira. Recordo de ter pensado: se um dia eu for estudar literatura é sobre isso que quero dedicar alguns anos. Um, depois outro, e outros anos foram passando até que chegou o dia que decidi escrever um projeto e tentar uma vaga em um programa de pós-graduação. Foi assim que cheguei até aqui. Este trabalho é fruto da minha dissertação apresentada ao programa de pós-graduação em estudos literários da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, na área de concentração de teoria da literatura e literatura comparada, na linha de pesquisa: Literatura e Políticas do Contemporâneo, sob orientação da Prof. Dra. Sabrina Sedlmayer.
Mais do que uma dissertação, esses anos nos corredores da FALE também me trouxeram imensas experiências e publicar esse texto agora, em formato de livro, é rememorar estes tantos bons momentos. Foi a partir dessa pesquisa que vivi a experiência de mergulhar na trajetória literária do meu escritor favorito, de tocar em seus livros e bisbilhotar suas anotações em suas bibliotecas em Lisboa, Azinhaga e Lanzarote. Para escrever essa pesquisa, me aproximei da Fundação José Saramago, de amigos e familiares do escritor em um imenso maio de 2013 do qual guardo tantas formosas saudades. Lá se vão quase 10 anos! Foi a partir desta investigação que cheguei também a minha primeira realização fílmica. Aproveitei a viagem para entrevistar pessoas que, a princípio, colaborariam para minha dissertação, mas que, ao final, viraram personagens do filme “um humanista por acaso escritor”, lançado em 2015, um ano depois da minha defesa de mestrado. Nele, críticos, escritores, amigos, esposa, neta e leitores, falam do lado humanista exercido em José Saramago ao longo de conferências pelo mundo. Até o filme eu voltei a visitar. Que engrandecedor foi tê-lo vivido.
Seguindo esse vagar, um dia chega-se a hora em que você recebe um convite de uma editora para transformar um trabalho de mestrado em livro. Que feliz! Justo e, por isso mesmo, agora. Em 16 de novembro de 2022 é tempo de celebrar o centenário do escritor português. 100 anos de nascer é tempo de se fazer presente. José sempre está. Essa obra é um gesto sutil e pequeno de fazê-lo lembrado. Outras maiores existem e existirão, sem dúvidas. Mas são das pequenas coisas que se cresce o mundo, afinal.
Aqui poderemos trafegar na trajetória literária do escritor, passando desde o seu período formativo até sua última fase de escrita. Faço aqui um recorte na revisão crítica da obra saramaguiana, elegendo a presença do barroco, do alegórico e da temática da finitude como recursos particularmente empregados na obra “As intermitências da morte”, de 2005. A partir desse recorte, busco investigar de que modo o escritor subverte a ideia da finitude como instrumento de dominação e oferece, via ficção, uma leitura singular de uma aguda consciência da morte. Assim mergulharemos nos caminhos da teoria, observando conceitos como do realismo maravilhoso, do barroco e, mais presente, do alegórico em José. Deslocaremos pelos caminhos da finitude na antropologia, na filosofia, na psicanálise mais rapidamente, sempre respingando no livro objeto deste trabalho que chego ousadamente a defini-lo como uma espécie de ensaio sobre a finitude. Espero que gostem do passeio.
A tudo isso, ao trabalho e as experiências proporcionadas por ele, sou só gratidão. Agradeço imensamente a mainha, minha mãe, Maria das Graças, Gal, pelo amor de costume. A minha orientadora Sabrina Sedlmayer, pelo carinho de sempre e por ter me ajudado a pousar. A todos os amigos da Fundação José Saramago, pela acolhida naquele lindo maio de 2013. Ao amigo Fernando Gómez Aguilera, pelo que deixou escrito. À Maria Leiria, pelo conto “A morte de Julião” e ao meu tio Dema, pela estante de Jorge Amado, que me fazia sonhar em ler e escrever literatura quando criança.
As intermitências da morte, de José Saramago: um ensaio alegórico da finitude
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DOI: 10.22533/at.ed.195230201
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Palavras-chave: 1. Saramago, José, 1922-2010 - Crítica e interpretação. I. Lopes, Leandro Silva. II. Título.
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Keywords: 1. Saramago, José, 1922-2010 - Crítica e interpretação. I. Lopes, Leandro Silva. II. Título.
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Abstract:
É provável que todo esse trabalho tenha começando quando um dia, ao ler o “Ensaio sobre a cegueira”, de José Saramago, cocei os olhos para ter certeza que não estava ficando cego. O livro, pela rica descrição, causa o medo de não poder olhar, muito menos reparar. A força de se perceber diante daquele gesto me tornou um completo apaixonado pela escrita saramaguiana. Daquele instante em diante, Saramago era leitura de cabeceira. Só os títulos revezavam. Um, depois outro, e outro, fui devorando toda a sua bibliografia. Seguindo esse vagar, um dia cheguei “As intermitências da morte”. Já na primeira frase: “No dia seguinte ninguém morreu”, constipei-me. De imediato, lembrei da sensação de anos antes, com a cegueira. Recordo de ter pensado: se um dia eu for estudar literatura é sobre isso que quero dedicar alguns anos. Um, depois outro, e outros anos foram passando até que chegou o dia que decidi escrever um projeto e tentar uma vaga em um programa de pós-graduação. Foi assim que cheguei até aqui. Este trabalho é fruto da minha dissertação apresentada ao programa de pós-graduação em estudos literários da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, na área de concentração de teoria da literatura e literatura comparada, na linha de pesquisa: Literatura e Políticas do Contemporâneo, sob orientação da Prof. Dra. Sabrina Sedlmayer.
Mais do que uma dissertação, esses anos nos corredores da FALE também me trouxeram imensas experiências e publicar esse texto agora, em formato de livro, é rememorar estes tantos bons momentos. Foi a partir dessa pesquisa que vivi a experiência de mergulhar na trajetória literária do meu escritor favorito, de tocar em seus livros e bisbilhotar suas anotações em suas bibliotecas em Lisboa, Azinhaga e Lanzarote. Para escrever essa pesquisa, me aproximei da Fundação José Saramago, de amigos e familiares do escritor em um imenso maio de 2013 do qual guardo tantas formosas saudades. Lá se vão quase 10 anos! Foi a partir desta investigação que cheguei também a minha primeira realização fílmica. Aproveitei a viagem para entrevistar pessoas que, a princípio, colaborariam para minha dissertação, mas que, ao final, viraram personagens do filme “um humanista por acaso escritor”, lançado em 2015, um ano depois da minha defesa de mestrado. Nele, críticos, escritores, amigos, esposa, neta e leitores, falam do lado humanista exercido em José Saramago ao longo de conferências pelo mundo. Até o filme eu voltei a visitar. Que engrandecedor foi tê-lo vivido.
Seguindo esse vagar, um dia chega-se a hora em que você recebe um convite de uma editora para transformar um trabalho de mestrado em livro. Que feliz! Justo e, por isso mesmo, agora. Em 16 de novembro de 2022 é tempo de celebrar o centenário do escritor português. 100 anos de nascer é tempo de se fazer presente. José sempre está. Essa obra é um gesto sutil e pequeno de fazê-lo lembrado. Outras maiores existem e existirão, sem dúvidas. Mas são das pequenas coisas que se cresce o mundo, afinal.
Aqui poderemos trafegar na trajetória literária do escritor, passando desde o seu período formativo até sua última fase de escrita. Faço aqui um recorte na revisão crítica da obra saramaguiana, elegendo a presença do barroco, do alegórico e da temática da finitude como recursos particularmente empregados na obra “As intermitências da morte”, de 2005. A partir desse recorte, busco investigar de que modo o escritor subverte a ideia da finitude como instrumento de dominação e oferece, via ficção, uma leitura singular de uma aguda consciência da morte. Assim mergulharemos nos caminhos da teoria, observando conceitos como do realismo maravilhoso, do barroco e, mais presente, do alegórico em José. Deslocaremos pelos caminhos da finitude na antropologia, na filosofia, na psicanálise mais rapidamente, sempre respingando no livro objeto deste trabalho que chego ousadamente a defini-lo como uma espécie de ensaio sobre a finitude. Espero que gostem do passeio.
A tudo isso, ao trabalho e as experiências proporcionadas por ele, sou só gratidão. Agradeço imensamente a mainha, minha mãe, Maria das Graças, Gal, pelo amor de costume. A minha orientadora Sabrina Sedlmayer, pelo carinho de sempre e por ter me ajudado a pousar. A todos os amigos da Fundação José Saramago, pela acolhida naquele lindo maio de 2013. Ao amigo Fernando Gómez Aguilera, pelo que deixou escrito. À Maria Leiria, pelo conto “A morte de Julião” e ao meu tio Dema, pela estante de Jorge Amado, que me fazia sonhar em ler e escrever literatura quando criança. -
Número de páginas: 80
- Leandro Silva Lopes