Assentamentos Rurais e dois Brasis bem Brasileiros: Uma Pesquisa Etnográfica no PA Tarumã Mirim - AM
Águida Meneses Valadares Demétrio é graduada em Ciências Contábeis e Mestra em Sociedade e Cultura na Amazônia, sua experiência de vida a conduziu vislumbrar apoio a famílias, cujos filhos e parentes se envolveram no uso de drogas psicotrópicas. Essa contribuição vem por meio de palestras e livros de autoajuda, que até o momento publicou sete sob os seguintes títulos: Quando a semente germina; Algemas da alma; Cristais do amanhecer; Lucros da vida; Drogas? Prazer e morte; Conversa de mãe e Quebrando paradigmas.
Este que vos apresento – ASSENTAMENTOS RURAIS E DOIS BRASIS BEM BRASILEIROS: UMA PESQUISA ETNOGRÁFICA NO PA TARUMÃ MIRIM-AM – é extensão de sua dissertação de mestrado, portanto segue uma abordagem acadêmica alicerçada em pesquisa de campo de viés etnográfico com apoio de Geertz (2008) e Malinowski (1978) realizada em um assentamento localizado no Tarumã Mirim, zona rural do município de Manaus-AM, que se constitui por leis, representatividades, normatizações, projetos e planos governamentais. Mas não é só isso. A pesquisa de campo traz à tona o que poucos conhecem: o que os moradores vivenciam em seu cotidiano quanto as suas especificidades nas relações sociais, precariedades nas vias de acesso ao loteamento dificultando a mobilidade das pessoas, o escoamento de produtos, porém não deixa de registrar a beleza cênica do lugar. Esse olhar analítico, sustentado por teoria e a pesquisa participante, faz enxergar as contradições e conduz a autora denominar de Brasil Ideal e Brasil Real, daí a ideia do título da obra.
A autora enfatiza que os assentamentos são divididos em dois grupos: a) os criados por meio de obtenção de terras pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), na forma tradicional, denominados Projetos de Assentamento (PAs); e, b) e aqueles implantados por instituições governamentais para acesso às políticas públicas do Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). É no primeiro grupo que o assentamento Tarumã Mirim se enquadra, lócus da pesquisa.
O livro é escrito em parceria com a profa. Rita Maria Puga Barbosa e dividem-no em duas partes e quatro capítulos:
Parte 1, A JURIDICIDADE: O BRASIL IDEAL, composta pelos capítulos:
a) Terra, Sociedade e Estado, que trata da normatização do assentamento. A relação dos indivíduos com o Estado, critérios e condicionantes exigidos para o assentamento.
b) A origem do projeto de assentamento Tarumã Mirim, aborda a forma como os indivíduos – pessoas físicas – para terem voz e poder, se tornam um, isto é, pessoa jurídica (Associação dos Assentados, Moradores e Trabalhadores na Agricultura Familiar do Ramal do Afatam), denominado pela autora de transubstanciação.
Parte 2, A REALIDADE: O BRASIL REAL é composto pelos capítulos:
a) Horizonte paralelo um mundo à parte no PA Tarumã Mirim, trata do cotidiano rural, da vida na roça e suas práticas socioculturais em meio ao ambiente de clima quente e úmido, seguindo o ciclo natural para cultivar a terra e produzir de olho no mercado onde ocorre comercialização dos produtos que servirão à mesa de muitas famílias. Diferentemente dos centros urbanos, muitos assentados ainda vivem longe do ambiente virtual, cercando-se em meio ao som das águas, dos insetos e a paisagem natural.
Essa excentricidade amazônica, de paisagismo natural, porém terras pobres de nutrientes que desfavorecem a produção agrícola, desencadeia dentre outros fatores, a apropriação da terra para espaço de lazer, o que contradiz as regras de produção do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e se torna um empecilho à legalização da mesma.
A caracterização da área de investigação revela as estradas e vicinais e as dificuldades da mobilidade humana e os meios de transporte, em período de chuva; a precariedade do sistema de saúde; a questão da habitação; a escola e as expectativas, os sonhos perseguidos.
Embasado em Baldino et al 2015), Bagno (2008; 2007 e 2003) e D’Olivo (2018), registra o linguajar caboclo em sua fonética regional, dentro do universo das variações linguísticas. Por outro lado, com precisão da discriminação auditiva, a autora revela, por meio das narrativas, o quão precário estar a escolaridade no campo:
Óia dona moça. Num é mintira não. A coisa é braba aqui, viu? É a gente pulá da frigidêra na brasa quente. A gente só tem duas opção. Morrê de fomi, ou morrê di priguiça, purquê a gente inté disanima de trabaiá, e di vêiz inquando perde tudo, purquê num consegue sair cum a produção quando chove. Eu, qui pranto chêro verde, chega o dia de tirá, se tive chovendo muito, num tem jeito, purquê o fretêro só entra pra pegá a prudução si tivé cum sol. Si as istrada tivé sêca. Vai fazê o quê, né dona? (ENT-21).
b). A face oculta do Tarumã Mirim. É onde a autora, como o próprio título traz, registrada aquilo que está sendo vivido e pouco percebido. Apoiada na leitura de Foucault (2013), nos traz uma leitura do panóptico e faz as adequações para o campo pesquisado, destacando o papel do INCRA nesse processo nas condições de vigiar e punir por meio de mecanismos de controle, disciplinador e poder pelo qual os assentados são submetidos.
A leitura contínua instiga o leitor a se aprofundar nas questões postas estimulando novas pesquisas, dado as particularidades nesses Brasis. Em suas considerações, a autora finaliza deixando sugestões construtivas para melhor andamento, gerenciamento e produtividade que pode vir a ser desencadeado no assentamento Tarumã Mirim, assim como, sem pretensão generalizadora, a outros assentamentos.
Por fim,
O conhecimento se expressa na oralidade e se reifica no grafismo de alguém,
Ele, o conhecimento, esclarece, reverbera e distancia o outro alguém.
Gláucio Campos Gomes de Matos
Doutor pela UNICAMP; Prof. Da FEFF e do PPGSCA/IFCHS da Universidade Federal do Amazonas – UFAM.
Assentamentos Rurais e dois Brasis bem Brasileiros: Uma Pesquisa Etnográfica no PA Tarumã Mirim - AM
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DOI: 10.22533/at.ed.923201507
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ISBN: 978-65-5706-192-3
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Palavras-chave: 1. Assentamento rural – Tarumã Mirim (AM). 2. Etnografia. 3.Agricultura familiar. I. Barbosa, Rita Maria dos Santos Puga. II.Título.
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Ano: 2020